Tu tens seios, lágrimas e pétalas

Na árvore em frente
Eu terei mandado instalar um alto-falante com que os passarinhos
Amplifiquem seus alegres cantos para o teu lânguido despertar.
Acordarás feliz sob o lençol de linho antigo
Com um raio de sol a brincar no talvegue de teus seios
E me darás a boca em flor; minhas mãos amantes
Te buscarão longamente e tu virás de longe, amiga
Do fundo do teu ser de sono e plumas
Para me receber; nossa fruição
Será serena e tarda, repousarei em ti
Como o homem sobre o seu túmulo, pois nada
Haverá fora de nós. Nosso amor será simples e sem tempo.
Depois saudaremos a claridade. Tu dirás
Bom dia ao teto que nos abriga
E ao espelho que recolhe a tua rápida nudez.
Em seguida teremos fome: haverá chá-da-índia
Para matar a nossa sede e mel
Para adoçar o nosso pão. Satisfeitos, ficaremos
Como dois irmãos que se amam além do sangue
E fumaremos juntos o nosso primeiro cigarro matutino.
Só então nos separaremos. Tu me perguntarás
E eu te responderei, a olhar com ternura as minhas pernas
Que o amor pacificou, lembrando-me que elas andaram muitas léguas de mulher
Até te descobrir. Pensarei que tu és a flor extrema
Dessa desesperada minha busca; que em ti
Fez-se a unidade. De repente, ficarei triste
E solitário como um homem, vagamente atento
Aos ruídos longínquos da cidade, enquanto te atarefas absurda
No teu cotidiano, perdida, ah tão perdida
De mim. Sentirei alguma coisa que se fecha no meu peito
Como pesada porta. Terei ciúme
Da luz que te configura e de ti mesma
Que te deixas viver, quando deveras
Seguir comigo como a jovem árvore na corrente de um rio
Em demanda do abismo. Vem-me a angústia
Do limite que nos antagoniza. Vejo a redoma de ar
Que te circunda – o espaço
Que separa os nossos tempos. Tua forma
É outra: bela demais, talvez, para poder
Ser totalmente minha. Tua respiração
Obedece a um ritmo diverso. Tu és mulher.
Tu tens seios, lágrimas e pétalas. À tua volta
O ar se faz aroma. Fora de mim
És pura imagem; em mim
És como um pássaro que eu subjugo, como um pão
Que eu mastigo, como uma secreta fonte entreaberta
Em que bebo, como um resto de nuvem
Sobre que me repouso. Mas nada
Consegue arrancar-te à tua obstinação
Em ser, fora de mim – e eu sofro, amada
De não me seres mais. Mas tudo é nada.
Olho de súbito tua face, onde há gravada
Toda a história da vida, teu corpo
Rompendo em flores, teu ventre
Fértil. Move-te
Uma infinita paciência. Na concha do teu sexo
Estou eu, meus poemas, minhas dores
Minhas ressurreições. Teus seios
São cântaros de leite com que matas
A fome universal. És mulher
Como folha, como flor e como fruto
E eu sou apenas só. Escravizado em ti
Despeço-me de mim, sigo caminhando à tua grande
Pequenina sombra. Vou ver-te tomar banho
Lavar de ti o que restou do nosso amor
Enquanto busco em minha mente algo que te dizer
De estupefaciente. Mas tudo é nada.
São teus gestos que falam, a contração
Dos lábios de maneira a esticar melhor a pele
Para passar o creme, a boca
Levemente entreaberta com que mistificar melhor a eterna imagem
No eterno espelho. E então, desesperado
Parto de ti, sou caçador de tigres em Bengala
Alpinista no Tibet, monje em Cintra, espeleólogo
Na Patagônia. Passo três meses
Numa jangada em pleno oceano para
Provar a origem polinésica dos maias. Alimento-me
De plancto, converso com as gaivotas, deito ao mar poesia engarrafada, acabo
Naufragando nas costas de Antofagasta. Time, Life e Paris-Match
Dedicam-me enormes reportagens. Fazem-me
O "Homem do Ano" e candidato certo ao Prêmio Nobel.
Mas eis comes um pêssego. Teu lábio
Inferior dobra-se sob a polpa, o suco
Escorre pelo teu queixo, cai uma gota no teu seio
E tu te ris. Teu riso
Desagrega os átomos. O espelho pulveriza-se, funde-se o cano de descarga
Quantidades insuspeitadas de estrôncio-90
Acumulam-se nas camadas superiores do banheiro
Só os genes de meus tataranetos poderão dar prova cabal de tua imensa
Radioatividade. Tu te ris, amiga
E me beijas sabendo a pêssego. E eu te amo
De morrer. Interiormente
Procuro afastar meus receios: "Não, ela me ama..."
Digo-me, para me convencer, enquanto sinto
Teus seios despontarem em minhas rnãos
E se crisparem tuas nádegas. Queres ficar grávida
Imediatamente. Há em ti um desejo súbito de alcachofras. Desejarias
Fazer o parto-sem-dor à luz da teoria dos reflexos condicionados
De Pavlov. Depois, sorrindo
Silencias. Odeio o teu silêncio
Que não me pertence, que não é
De ninguém: teu silêncio
Povoado de memórias. Esbofeteio-te
E vou correndo cortar o pulso com gilete-azul; meu sangue
Flui como um pedido de perdão. Abres tua caixa de costura
E coses com linha amarela o meu pulso abandonado, que é para
Combinar bem as cores; em seguida
Fazes-me sugar tua carótida, numa longa, lenta
Transfusão. Eu convalescente
Começas a sair: foste ao cabeleireiro. Perscruto em tua face. Sinto-me
Traído, delinqüescente, em ponto de lágrimas. Mas te aproximas
Só com o casaco do pijama e pousas
Minha mão na tua perna. E então eu canto:
Tu és a mulher amada: destrói-me! Tua beleza
Corrói minha carne como um ácido! Teu signo
É o da destruição! Nada resta
Depois de ti senão ruínas! Tu és o sentimento
De todo o meu inútil, a causa
De minha intolerável permanência! Tu és
Uma contrafação da aurora! Amor, amada
Abençoada sejas: tu e a tua
Impassibilidade. Abençoada sejas
Tu que crias a vertigem na calma, a calma
No seio da paixão. Bendita sejas
Tu que deixas o homem nu diante de si mesmo, que arrasas
Os alicerces do cotidiano. Mágica é tua face
Dentro da grande treva da existência. Sim, mágica
É a face da que não quer senão o abismo
Do ser amado. Exista ela para desmentir
A falsa mulher, a que se veste de inúteis panos
E inúteis danos. Possa ela, cada dia
Renovar o tempo, transformar
Uma hora num minuto. Seja ela
A que nega toda a vaidade, a que constrói
Todo o silêncio. Caminhe ela
Lado a lado do homem em sua antiga, solitária marcha
Para o desconhecido – esse eterno par
Com que começa e finda o mundo – ela que agora
Longe de mim, perto de mim, vivendo
Da constante presença da minha saudade
É mais do que nunca a minha amada: a minha amada e a minha amiga
A que me cobre de óleos santos e é portadora dos meus cantos
A minha amiga nunca superável
A minha inseparável inimiga.


Vinicius de Moraes
























Sull'albero di fronte
avrò fatto sistemare un altoparlante con cui gli uccellini
amplifichino i loro canti allegri per il tuo languido risveglio.
Ti sveglierai felice sotto il lenzuolo di lino antico
con un raggio di sole che gioca nell'incavo dei tuoi seni
e mi darai la bocca in fiore; le mie mani amanti
ti cercheranno a lungo e tu verrai da lontano, amica
dal fondo del tuo essere di sonno e piume
per accogliermi; il nostro godimento
sarà sereno e lento, riposerò in te
come l'uomo sul suo tumulo, poiché nulla
ci sarà al di fuori di noi. Il nostro amore sarà semplice e senza tempo.
Poi saluteremo il chiarore. Tu dirai
buongiorno al soffitto che ci ripara
e allo specchio che raccoglie la tua rapida nudità.
Dopo avremo fame: ci sarà tè dell'India
per saziare la nostra sete e miele
per raddolcire il nostro pane. Soddisfatti, resteremo
come due fratelli che si amano al di là del sangue
e fumeremo insieme la nostra prima sigaretta del mattino.
Solo allora ci separeremo. Tu mi domanderai
e io ti risponderò, guardando con tenerezza le mie gambe
che l'amore ha placato, ricordandomi che esse hanno camminato molte leghe di donne
fino a scoprirti. Penserò che tu sei l'ultimo fiore
di questa mia disperata ricerca; che in te
si è fatta l'unità. All'improvviso, sarò triste
e solo come un uomo, vagamente attento
ai rumori distanti della città, mentre assurda ti affaccendi
nel tuo quotidiano, smarrita, ah così smarrita
da me. Sentirò qualcosa che si chiude nel mio petto
come una porta pesante. Sarò geloso
della luce che ti configura e di te stessa
che ti lasci vivere, quando dovresti
seguire con me come il giovane albero lungo la corrente di un fiume
in cerca dell'abisso. Mi viene l'angoscia
del limite che ci rende antagonisti. Vedo la calotta d'aria
che ti circonda - lo spazio
che separa i nostri tempi. La tua forma
è un'altra: troppo bella, forse, per poter
essere totalmente mia. Il tuo respiro
ubbidisce a un ritmo diverso. Tu sei donna.
Tu hai seni, lacrime e petali. Intorno a te
l'aria diventa profumo. Fuori di me
sei pura immagine; in me
sei come un uccello che io soggiogo, come il pane
che mastico, come una segreta fontana socchiusa
in cui bevo, come un residuo di nuvola
su cui riposo. Ma nullav riesce a strapparti alla tua ostinazione
di essere, fuori di me - e io soffro, amata
che tu non mi sia di più. Ma tutto è nulla.
Guardo all'improvviso il tuo volto, dov'è incisa
tutta la storia della vita, il tuo corpo
che dirompe in fiori, il tuo ventre
fertile. Ti muove
un'infinita pazienza. Nella nicchia del tuo sesso
ci sono io, le mie poesie, i miei dolori
le mie resurrezioni. I tuoi seni
sono brocche di latte con cui sazi
la fame universale. Sei donna
come foglia, come fiore e come frutto
e io sono semplicemente solo. Schiavo di te
mi accomiato da me, continuo a camminare alla tua grande
piccolina ombra. Ti vedrò fare il bagno
laverò da te ciò che è rimasto del nostro amore
mentre cerco nella mia mente qualcosa da dirti
di stupefacente. Ma tutto è nulla.
Sono i tuoi gesti a parlare, la contrazione
delle labbra in modo da stirare meglio la pelle
per darti la crema, la bocca
lievemente socchiusa con cui mistificare meglio l'eterna immagine
nell'eterno specchio. E allora, disperato
parto da te, sono cacciatore di tigri nel Bengala
alpinista sul Tibet, monaco a Cintra, speleologo
in Patagonia. Passo tre mesi
in una zattera in pieno oceano per
provare l'origine polinesiana dei maia. Mi nutro
di plancton, parlo con i gabbiani, affido al mare poesie in una bottiglia, finisco
per naufragare sulle coste di Antofagasta. Time, Life e Paris Match
mi dedicano grandi servizi. Mi fanno
"l'Uomo dell'Anno" e candidato sicuro al Premio Nobel.
Ma ecco che mangi una pesca. Il tuo labbro
inferiore si piega sotto la polpa, il succo
scorre sul tuo mento, cade una goccia sul tuo seno
e tu ridi. Il tuo riso
disgrega gli atomi. Lo specchio si polverizza, il tubo di scarico si fonde
quantità insospettate di stronzio-90
si accumulano negli strati superiori del bagno
solo i geni dei miei pronipoti potranno dare una prova precisa della tua immensa
radioattività. Tu ridi, amica
e mi baci sapendo di pesca. E io ti amo
da morire. Dentro di me
cerco di allontanare le mie paure: "No, lei mi ama...".
Me lo dico per convincermi, mentre sento
i tuoi seni sbocciare nelle mie mani
e contrarsi le tue natiche. Vuoi rimanere incinta
immediatamente. C'è in te un improvviso desiderio di carciofi. Vorresti
un parto indolore alla luce della teoria dei riflessi condizionati
di Pavlov. Poi, sorridendo
taci. Odio il tuo silenzio
che non mi appartiene, che non è
di nessuno: il tuo silenzio
popolato di ricordi. Ti schiaffeggio
e corro a tagliarmi le vene con una lametta-blu; il mio sangue
sgorga come una richiesta di perdono. Apri la tua scatola del cucito
e cuci col filo giallo il mio polso abbandonato, che è per
associare bene i colori; dopo
mi fai succhiare la tua carotide, in una lunga, lenta
trasfusione. Io convalescente
cominci a uscire: sei stata dal parrucchiere. Scruto il tuo viso. Mi sento
tradito, deliquescente, sul punto di piangere. Ma ti avvicini
solo con la giacca del pigiama e posi
la mia mano sulla tua gamba. E allora io canto:
tu sei la donna amata: distruggimi! La tua bellezza
corrode la mia carne come un acido! Il tuo segno
è quello della distruzione! Nulla resta
dopo di te se non rovine! Tu sei il senso
di tutto il mio inutile, la causa
della mia intollerabile permanenza! Tu sei
una contraffazione dell'aurora! Amore, amata
tu sia benedetta: tu e la tua
impassibilità. Benedetta tu sia
tu che crei la vertigine nella calma, la calma
in seno alla passione. Benedetta tu sia
tu che lasci l'uomo nudo di fronte a se stesso, che abbatti
le fondamenta del quotidiano. Magico è il tuo viso
nella grande oscurità dell'esistenza. Sì, magico
è il viso di colei che non vuole se non l'abisso
dell'essere amato. Ci sia lei per smentire
la falsa donna, colei che si veste di inutili panni
e inutili danni. Lei possa, ogni giorno
rinnovare il tempo, trasformare
un'ora in un minuto. Ella sia
colei che nega ogni vanità, colei che costruisce
tutto il silenzio. Cammini
al fianco dell'uomo nella sua antica, solitaria marcia
verso l'ignoto - questa eterna coppia
con cui comincia e finisce il mondo - lei che ora
lontano da me, vicino a me, mentre vive
della costante presenza della mia nostalgia
è più che mai la mia amata: la mia amata e la mia amica
colei che mi sparge di olio santo ed è la depositaria dei miei canti
la mia amica mai superabile
la mia inseparabile nemica.

Vinicius de Moraes


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